sábado, 11 de fevereiro de 2012

Lendas de Guerra - A unificação dos Reinos - Capítulo IV

- Capítulo IV -



Tom cavalgava juntamente com o exército de Vallars debaixo de um sol brilhante, teria sido uma marcha de quatro dias rumo à frente da batalha na fronteira com o norte. Os seus lábios estavam ressequidos, teria visto alguns soldados da infantaria tombarem pelo caminho, o comandante que liderava o exército não autorizava interrupções para assistir os feridos ou enterrar os mortos. Os cavaleiros eram privilegiados pelo seu estatuto e pelas suas montadas, mas a sede, essa chegava a todos. O acampamento surtiu como uma miragem, juntos iriam compor uma força de mil cavaleiros e oito mil de infantaria. Iriam estabelecer uma base com o intuito de avançar para Essin, ao reino do lorde Murtosa e tomá-lo de uma investida só. Fortificando-se daquele ponto, iriam distribuir toda as operações militares a partir daquele local. Falcon sempre se sentira superior ao norte e partia do princípio que iria ter uma retaliação fraca. Pretendia terminar aquela guerra rapidamente.
Tom repousava agora sobre os estábulos sentado sobre um farto de palha cabisbaixo. Ned aproximasse dele intrigado pelo seu silêncio pouco habitual.
- O que se passa contigo? Pensei que fosse isto que quisesses, foi para isto que os nossos pais nos prepararam durante os últimos anos.
Como que contornando o assunto Tom responde à pergunta que não tinha sido colocada…
- Conheci uma rapariga a semana passada, dois dias antes de sermos recrutados. Vou lutar uma guerra que ninguém sabe o motivo da mesma, contra um povo que não conheço e nunca me afrontou, para alcançar uma honra que não me serve para nada. Eu nunca quis nada disto, os nossos pais lutaram para que nós fossemos poupados deste dia, agora diz-me se valeu a pena eles se privarem da nossa infância e dos nossos sonhos. Nós vamos morrer nesta guerra e as nossas gerações iram morrer connosco. Não vai haver ninguém para contar a nossa história.
- Eles sobreviveram, não foi? Tu também vais sobreviver e quem sabe quando regressares aquela miúda que falas esteja a tua espera. A menos que seja mesmo gira aí sou capaz de te passar a perna. – Comenta Ned numa gargalhada despenteando o cabelo farto do seu companheiro.
Um oficial entrou de rompante dando o alerta, a tribo dos selvagens avançava ferozmente em corrida num número perto de trezentos guerreiros de foices, machados e escudos de madeira e ferro. O comandante ordenou a cem cavaleiros que travassem a investida. Subindo rapidamente para os seus cavalos Tom e Ned iriam por a prova as suas aptidões num primeiro teste que não dava segundas oportunidades a ninguém.
Colocaram-se nas fileiras, os gritos das instruções ecoavam com um som estridente e incompreensível, no entanto desnecessário. Eles sabiam o que tinham de fazer, as instruções eram um mero protocolo, ao sinal avançaram sobre os cavalos de guerra de lanças empunhadas contra a força inimiga, um jovem capitão liderava a montada, queria ser o primeiro a colher o seu troféu, Tom mais atrás observava o seu acampamento encolhendo aos seus olhos. Já tinha escutado histórias da ignorância e das imprudências dos selvagens, mas um ataque de um número tão pequeno em plena luz do dia sem tempo para causar surpresa era um suicídio incompreensível, talvez em excesso. O exército que marchava travou o seu passo, apreensivo o capitão prosseguiu com a sua ordem. Uma lomba que afastava o controlo visual do outro lado do campo deu-lhe um mau pressentimento. Uma coluna de arqueiros surgiu subitamente entre eles e os selvagens. Num ataque controlado os céus se enegreceram de flechas que desceram sobre os cavaleiros em toda a sua fúria. Os soldados de Vallars começaram a tombar rapidamente, uma flecha trespassou o jovem capitão que tombou morto por debaixo do seu cavalo. Tom separou-se de Ned, tentava procurar o seu companheiro no meio do alvoroço mas tinha de dar prioridade à investida que descia sobre eles. Alguns jovens que nunca teriam participado de uma batalha começavam a recuar com os seus cavalos em desespero. Outra investida de flechas em fogo caiu a duzentos metros do seu percurso, separando agora aquele pequeno exército do acampamento através dum rio de fogo.
Ao longe o comandante observava o movimento completamente atónito e sem reacção, recompondo-se ordenou à infantaria que se colocasse em posição e deu a ordem de avanço.
O exército dos selvagens do norte prosseguiu com a sua investida numa altura que os arqueiros do clã dos bosques se dispersavam do seu caminho. Tom despertou debaixo do seu cavalo morto. Sentia a sua perna presa, o cheiro do fumo teria coberto toda a planície e o som do grito dos bárbaros que se aproximavam era ensurdecedor. Forçando a sua perna conseguiu se soltar. Ao seu lado haviam alguns soldados desnorteados sem reacção. – O que fazemos? -questionava um dos jovens. Observando a alguns metros o capitão morto, Tom assentiu com firmeza a autoridade que lhe ofereciam…
- Agora?... Lutamos pelo nosso rei e pela nossa pátria.
Os cavaleiros alimentaram-se daquela coragem de um jovem determinado e desembainharam as suas espadas num grito de guerra. Tom liderou a pé a marcha avistando os selvagens a poucos metros. Por entre o fumo escutava os passos pesados, o som dos primeiros golpes cortantes. Embateu furiosamente contra um bárbaro de estatura baixa, gordo e calvo com talvez o triplo da sua idade. O homem defendia com dificuldade os seus golpes, Tom sabia que teria de ser rápido pois o número de oponentes crescia rapidamente como uma infestação. A sua espada trespassou aquele corpo como muitas vezes teria trespassado bonecos de palha nos treinos do seu pai. Nunca tinha estado numa batalha e a velocidade com que matou três homens foi demasiado rápida para recordar qual deles teria sido o primeiro, e que realmente era verdade, ele tinha morto um homem, agora não havia retorno.
Não tinha tido tempo para temer pela sua vida, os guerreiros eram homens sem formação de combate, o insulto aos cavaleiros de Vallars, no entanto por entre os selvagens aproximou-se um enorme soldado, corpulento, da sua mão pendia um machado enorme manchado com o sangue dos seus companheiros. Avançou furiosamente contra ele embatendo aquela arma na sua espada. O impacto empurrou-o contra o chão sentindo como um zunido estridente do choque do ferro atordoando-lhe os ouvidos. O machado desceu fortemente contra ele, Tom desviou-se rapidamente tentando se recompor. Lentamente a sua mente florescia, o cansaço se continha num ritmo acelerado, a sua transpiração se controlava lentamente num exame instintivo que lhe cedia tudo o que ele precisava saber para sobreviver os próximos segundos. Num curto relance apercebeu-se que tinha a seu favor a velocidade, a juventude, o vigor e a destreza, teria que manter a distância investindo em golpes laterais, dançando rapidamente com o seu adversário. Quando avançou novamente não era mais aquele rapaz que teria saído de Hellian a alguns dias atrás. Agora ele era um soldado de Vallars, frio e implacável.
Embateu com toda a força que tinha violentamente contra o escudo do bárbaro que recuava lentamente face as investidas. Por duas vezes a espada teria proferido golpes nas suas laterais desprotegidas da armadura espessa. O homem estava exausto mas não cedia, era um guerreiro veterano. Surpreendeu o Tom com o cabo do seu machado, atingindo-o fortemente no rosto, sem tempo para se recuperar recebeu outro golpe do machado que se afundou na sua carne junto à cintura. Em agonia respondeu-lhe com um golpe lateral no rosto que lhe arrancou a máscara de guerra deixando-lhe um rosto completamente desfigurado. Os dois soldados andavam em círculos cambaleando sobre os seus ferimentos. Enquanto observava sem fôlego o seu oponente uma espada trespassa o bárbaro por trás fazendo-o tombar de joelhos. Ned revela-se por detrás da figura de arma em punho e um rosto atormentado manchado de sangue, parecia ter envelhecido quinze anos desde há instantes.
- Estás bem? – Questiona ele rapidamente.
- To a aquecer ainda! Obrigado!
Ned ignorou a gratidão do seu companheiro, colocando-se rapidamente de costas para ele numa altura em que se viam cercados por cerca de quinze bárbaros. Retomaram uma nova força em conjunto e começaram a distribuir golpes rapidíssimos com uma elegância distinta. A poucos metros avançava a infantaria de Vallars ao seu auxílio. Ao cimo da colina o comandante Anglus observava a batalha consumido pelo espanto, observando o seu auxiliar questiona-o.
- Quem são aqueles dois cavaleiros que sozinhos já mataram mais de quarenta selvagens?
- Apoderando-se do comprido monóculo o auxiliar confirma o reconhecimento.
- Aqueles são o Tom MCcalan e o Ned Rodden, são dois dos jovens reforços de Hellian.
- MCcalan! – Comenta o comandante num tom de espanto e surpresa. O misterioso nome renascia das cinzas do seu esquecimento como uma luz na escuridão.

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